Estimativa do setor é de que medida poderia baixar em R$ 0,25 por litro o preço final da gasolina.
A Câmara de Comércio Exterior do governo federal (Camex) discute a possibilidade de zerar o imposto de importação de álcool a partir ainda do mês de novembro. A discussão é consequência de um pedido de distribuidoras de combustível obtido com exclusividade pela CNN.
A cartada do setor vem em meio à escalada dos preços dos combustíveis e poderia ser uma maneira de baixar em R$ 0,25 por litro o preço final da gasolina. Um carro com tanque de 60 litros, por exemplo, a economia seria R$ 15. No entanto, pode ser que a medida enfrente resistência de integrantes do Ministério da Agricultura para ser implantada.
Um ofício e uma nota técnica recebidos pela Secretaria da Fazenda do Ministério da Economia, pedindo a redução temporária do imposto de importação do álcool. Os documentos são assinados pelas distribuidoras Ipiranga e Vibra (antiga BR), pela Federação Brasilcom, que representa 43 distribuidoras médias e pequenas e pela Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis (Abicom).
“Com a redução do Imposto de Importação do etanol anidro, será possível garantir uma redução do custo da gasolina da ordem de R$0,183 por litro, que dependendo da carga tributária incidente (ICMS) e dos custos logísticos poderá representar uma redução para o consumidor final da ordem de R$0,25 por litro de gasolina C”, informa a nota técnica enviada ao governo federal.
A discussão pode entrar na pauta da próxima reunião do Comitê Executivo da Camex, que é ligada ao Ministério da Economia. O encontro do chamado Gecex está marcado para o próximo dia 17/11, quarta-feira, entre 10h e 12h. A pasta, diz, no entanto, que não é possível confirmar a pauta das reuniões do grupo.
Na prática, a redução se deve à mistura final do combustível. É que a gasolina que sai das distribuidoras e vai para os postos de combustível não é pura, ela tem 27% de etanol anidro na mistura. E o imposto de importação do produto, que é de 20%, encarece também o preço final do combustível abastecido nos veículos brasileiros.
O etanol anidro é o álcool com um teor de água inferior ou igual a 1% do volume. Convencionou-se chamar de etano o álcool usado em combustíveis.
No pedido, as distribuidoras alegam que seria necessário importar cerca de 900 mil m3 de etanol anidro do começo de novembro ao fim de abril de 2022 para complementar a produção nacional durante a entressafra. Eles criticam a distribuição de cotas de isenção de tarifas – como as do ano passado – distribuídas exclusivamente a usineiros, que controlam o mercado de etanol nacional e passaram a importar por conseguir melhores valores nos últimos dois anos.
O apelo ao governo federal é assinado pelo presidente da Abicom, Sérgio de Souza Araujo, pelo vice-presidente executivo da Brasilcom, Abel Leitão, por Guido Rogerio Macedo Silveira Filho que é diretor jurídico e de Relações Institucionais da Ipiranga Produtos de Petróleo e por Marcelo Fernandes Bragança, Diretor de Operações da Vibra Energia.
Racha no Gecex
A CNN apurou que o tema dividiu os integrantes do Gecex, opondo representantes dos ministérios da Economia e Agricultura. São dois enviados da Ministra Tereza Cristina na composição do grupo, que podem defender teses e influenciar a votação dos demais membros. Ao todo são 11 membros, seis vem do Ministério da Economia, incluindo o próprio ministro. Há ainda dois representantes do Ministério de Relações Exteriores e um indicado da Presidência da República.
O Ministério da Agricultura defende que “não há qualquer garantia que, caso houvesse uma reversão dos preços do etanol na sua origem (EUA) ou uma queda na taxa de juros, o produto, chegando ao país com preço mais atrativo, teria está queda repassada ao consumidor final”. Dizem ainda que “na hipótese da retirada total do imposto de importação, ainda assim, o produto importado chegaria a um preço R$ 0,24/litro, superior ao valor do que é produzido no Brasil”, o que não justificaria abrir mão da tarifa.
Pessoas ligadas ao colegiado ouvidas pela CNN dizem que as afirmações não são consenso no grupo. Entusiastas da proposta das distribuidoras, enviados do ministro Paulo Guedes entendem que qualquer impacto no preço do combustível pra tornar o valor final mais barato poderia impactar diretamente na inflação, que tem subido a galope e se espalhado em diversos setores com a alta da gasolina, diesel, querosene de aviação e gás natural.
Questionado pela CNN, o Ministério da Economia não comentou a divergência entre os membros e se limitou a dizer que “Notas Técnicas ou Informativas referentes a pleitos são documentos preparatórios que subsidiam decisões dos dirigentes nas questões de política econômica. Assim, possuem nível de acesso restrito e não devem ser divulgadas até a publicação da decisão final”.
Necessidade de importar
Outro ponto de conflito é a real necessidade de trazer álcool de fora para o Brasil. O Ministério da Agricultura diz que participa mensalmente de encontro entre órgãos do governo (MME/Mapa/ANP/EPE) e o setor de produção, distribuição e comercialização de combustível e que “no último encontro, realizado em início de outubro, ficou comprovado – e não houve qualquer contestação – principalmente pelo setor de distribuição, que os estoques [de etanol] são suficientes para atravessar a entressafra da produção de etanol (dezembro a março)”.
Distribuidoras e importadores discordam. A Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis (Abicom) sustenta que a demanda de etanol importado vem caindo desde de 2017 depois de anos em expansão, mas que ainda é grande. A associação usa como base um estudo da consultoria StoneX que prevê importações menores que anos anteriores mas espalhadas por todas as regiões do país.
“O maior volume de importação também deve ocorrer no Norte e Nordeste do país, sobretudo dos países do Mercosul, como o Paraguai, diante do fim da cota isenta de tarifa para os EUA. Apesar disso, mesmo considerando a incidência de tarifa de 20% para compras americanas, a janela de importação do etanol oriundo dos EUA já se mostra aberta entre novembro/21 e abril/22 em Suape (PE), o que deve elevar a oferta do produto no mercado doméstico. No entanto, a expectativa é de que o volume internalizado ainda se situe abaixo do observado em anos anteriores, quando havia isenção de tarifação”, diz o documento.
Toma lá da cá
No meio da discussão há ainda um aspecto diplomático em debate. É que o Brasil luta pra tentar convencer os Estados Unidos a abrirem mão do imposto de importação do açúcar. A taxação poderia favorecer os fabricantes brasileiros do produto. E nessa negociação a tarifa de 20% imposta ao etanol dos EUA têm sido usada como moeda de troca.
O Ministério da Agricultura confirmou que o assunto segue em negociação. “Em várias ocasiões, foi proposto àquele governo uma negociação em que o etanol entraria no Brasil com alíquota zero, caso os EUA retirassem as barreiras ao açúcar brasileiro. Este assunto, ainda está em negociação, diz a nota.