Angolana se prepara para tentar vaga de medicina no Brasil via Enem: ‘as pessoas se matam por uma vaga’

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Ela chegou ao país depois das inscrições do exame desse ano terem se encerrado. Só vai poder concorrer em 2019, mas neste ano vai encarar Fuvest e duas particulares.

Emanuela Neto, de 20 anos, viajou mais de 6.500 km para estudar medicina no Brasil. Saiu sozinha de Luanda, capital de Angola, e embarcou para São Paulo. Havia sido informada de que, na capital paulista, seria fácil entrar em uma universidade pública. Caso não fosse aprovada, as faculdades particulares seriam de baixo custo. Chegou ao país e levou um susto: deparou-se com mensalidades acima de R$ 7 mil e concorrência de 135 candidatos por vaga em instituições públicas.

Era a segunda frustração seguida. Emanuela havia conseguido uma bolsa para cursar medicina na Rússia. Mas o governo angolano, com dificuldades financeiras, cortou todos os benefícios dos estudantes. A decisão de vir ao Brasil veio após conversar com uma prima, que mora no Brasil. “Ela me disse que o ensino superior era muito acessível aqui. Depois descobri que ela vive em uma bolha, sem noção da realidade. Cheguei e percebi que as pessoas se matam por uma vaga em medicina. Foi um susto”, diz a jovem.

Mas Emanuela não desiste. O desejo de ser médica tem uma motivação social: ela sonha em melhorar o serviço de saúde pública em Angola.

Quero voltar para trabalhar na minha terra. Lá, os hospitais são precários. Muita gente morre por falta de um cardiologista, por exemplo.
— Emanuela Neto

Na infância, a menina já brincava de ser médica. Depois, na adolescência, fez o ensino médio técnico em enfermagem, para se dedicar à “arte de cuidar do próximo”. Conseguiu, na época, um estágio de 6 meses em um hospital. “Passei por vários setores diferentes e aprendi muito. Sou viciada em veias. Me chamavam quando precisavam de ajuda em algum cateterismo”, conta.

Sua mãe, farmacêutica, e sua avó, enfermeira cirúrgica, sempre incentivaram o desejo de Emanuela. Mas não esperavam tantas dificuldades no percurso.

Como a jovem só chegou ao Brasil em julho, não conseguiu se inscrever para o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) deste ano – e se prepara para ser aprovada em 2019. Foi possível apenas se candidatar na Fuvest e em duas universidades particulares.

O fato de só fazer o Enem no ano que vem não a desanima. Ela sabe que precisa de tempo para estudar. “Aqui no Brasil, cobram a matéria de um jeito muito diferente. A matemática é monstruosa. Em Angola, aprendemos em um nível bem mais básico. Também é difícil aprender história do Brasil e geografia daqui. Pelo menos, o idioma é o mesmo”, relata.

Emanuela Santos assiste à aula no cursinho. — Foto: Luiza Tenente/G1

Rotina de estudos

Emanuela vive em um lar de madres na região da avenida Paulista, onde tem direito às refeições. Consegue pagar a mensalidade do cursinho Maximize com a ajuda da mãe. “Mas não é uma situação financeira fácil. Ela recebe o salário na nossa moeda local. Para converter para o real, perdemos muito dinheiro”, diz Emanuela.

Por isso, ela não desperdiça tempo. Faz valer cada aula. Aos finais de semana, relê o que aprendeu e faz resumos. Pendura todos os papéis na parede do quarto. Celular? Só se for para se comunicar com a família. “Prefiro ficar lendo sobre ossos. Eu amo anatomia”, ri.

Mas nenhum dos obstáculos – nem a matemática, nem a dificuldade financeira – abala mais Emanuela do que a saudade de casa. Ela se emociona ao falar da mãe. “Sonho que ela venha aqui ficar comigo um dia. Ou que eu volte para Angola logo, como médica.”


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