Anúncios de candidatos em resultados de buscas na web por adversários geram disputa na Justiça

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Candidato ao Senado em SP foi multado por anúncio que aparecia para quem buscava nomes do PSDB. Ele alega que o partido concorrente fez o mesmo no YouTube. Google entra na disputa e caso deve ir ao TSE.

Anúncios em páginas de buscas na internet viraram um campo de batalha nestas eleições. Pela primeira vez, a lei permite que candidatos façam este tipo de publicidade, o chamado link patrocinado. Isso já gerou uma dúvida que chegou à Justiça Eleitoral: a propaganda pode ser feita para quem busca o nome de um adversário?

O TRE-SP proibiu anúncios do candidato ao Senado Jilmar Tatto (PT-SP) que eram direcionados a quem buscava nomes de adversários no Google. A ação foi movida pelos candidatos do PSDB ao Senado, Mara Gabrilli e Ricardo Tripoli, que apontaram “conduta fraudulenta”.

O colegiado do TRE-SP decidiu na quarta-feira (19) que os anúncios são irregulares, pois “alteram e perturbam” a campanha eleitoral dos candidatos adversários. Além disso, na segunda-feira (24), o TRE confirmou o valor da multa de R$ 20 mil a Jilmar Tatto pelas propagandas.

A defesa de Tatto disse que vai recorrer ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O prazo para entrar com recurso é de três dias à partir desta segunda. Como a liberação de links patrocinados em eleição é nova, uma possível decisão do TSE pode ser referência para esclarecer a regra de anúncios com nomes de adversários.

O petista diz que a proibição é uma “afronta à liberdade de propaganda”. Os advogados alegam que a própria coligação liderada pelo PSDB em SP faz anúncios no YouTube que aparecem para quem busca nomes de outros candidatos.

O Google, dono do site de busca e do YouTube, também foi intimado na ação. A empresa defendeu que o link patrocinado com nome de adversário não deve ser proibido, por ser “comparação e apresentação de alternativa típica do jogo democrático”.

Como são os anúncios

A busca pelo nome de Ricardo Tripoli, por exemplo, chegava a um link patrocinado com o seguinte título: “Procurando por Ricardo Tripoli? / Conheça Jilmar Tatto”

Dentro do link, havia texto com os seguintes trechos: “Conheça Jilmar Tatto, o melhor candidato a senador! Estava procurando por Ricardo Tripoli no Google? Temos uma opção melhor e mais alinhada com o que o povo de São Paulo precisa.”

Anúncio pago por Jilmar Tatto (PT) no Google era direcionado para quem buscava nome de adversários na eleição para o Senado como Ricardo Tripoli (PSDB) — Foto: Reprodução / Google

Já os anúncios do YouTube citados pela defesa são do candidato ao governo de São Paulo na coligação liderada pelo PSDB, João Doria. Um link patrocinado da campanha de Doria apareceu na busca do YouTube pelo termo “Haddad” (candidato à presidência pelo PT, partido de Tatto).

Mas a equipe do PSDB nega que tenha direcionado o link à busca pelo nome do candidato do PT. Eles argumentam que o resultado foi incluído de forma automática pela ferramenta de publicidade do YouTube (entenda mais abaixo nesta reportagem).

Anúncio de João Doria em página de busca no YouTube aparece em resultado de busca pelo termo “Haddad” — Foto: Reprodução / YouTube

Como funcionam os anúncios no Google

Para a publicidade em geral, o Google permite anúncios, que aparecem nos resultados quando alguém busca por uma palavra específica. Nenhum anunciante tem direito exclusivo a ela, porém. Então, há uma espécie de leilão entre os anunciantes: quem paga mais tem mais visibilidade.

Por exemplo, uma fabricante de calçados A pode escolher até mesmo o nome de uma concorrente B. Assim, quando alguém busca pela concorrente B, quem aparece no anúncio é a fabricante A. É isso que Jilmar Tatto fez com os nomes de “Mara Gabrilli” e “Ricardo Tripoli”

Outra opção é escolher termos relacionados à sua atividade. No caso da fabricande de calçados, por exemplo, a palavra “sapato”. Mas esse mecanismo também pode ser utilizado por empresas que querem aparecer quando o nome da concorrente é buscada. E é isso que, segundo o PT, o PSDB está fazendo no YouTube para permitir que “João Doria” apareça quando alguém busca “Haddad”.

A prática não é barrada pelo Google e não é proibida expressamente na lei brasileira – apesar de alguns casos de empresas que questionaram na Justiça, ainda não há decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que tenha botado um ponto final na discussão.

Equipe de Doria diz que não direcionou a ‘Haddad’

A equipe de comunicação da campanha de Doria diz que não direcionou o termo “Haddad” para links patrocinados do tucano no YouTube. O anúncio pode ter aparecido na busca devido a alguma associação da ferramenta de publicidade do site com o perfil de público indicado na campanha.

Por exemplo, a ferramenta pode ter associado a busca por “Haddad” a “pessoas interessadas por política” e então mostrou o anúncio de Doria, eles afirmam.

A equipe jurídica de João Doria citou um processo em que a coligação estadual liderada pelo PT em SP questionou uma busca pelas palavras “partido dos trabalhadores”, que também levava a um link patrocinado de Doria.

Na ação, o PSDB esclareceu que as palavras patrocinadas eram “trabalhador” e “trabalhadores”. O termo é usado na campanha para governador, como os que o colocam como “João trabalhador”.

O Google, dono do YouTube, foi intimado, confirmou que, nesse caso, o termo comprado não foi “partido dos trabalhadores”, e sim “trabalhadores”, e a ação do PT foi julgada improcedente pelo TRE-SP.

Anúncio em busca adversária por acaso

A ferramenta de anúncio do YouTube é diferente da do Google, e a hipótese de o link patrocinado ter aparecido sem que a palavra tenha sido escolhida é possível, diz Isabel Furtado, especialista em marketing, ex-funcionária do Google e dona da Gawa, parceira oficial do site de busca para treinamentos sobre anúncios.

No YouTube, é possível indicar um perfil de público a ser atingido, e o próprio sistema do site direciona os resultados em buscas diversas, ela explica.

“Dependendo de como fizeram a campanha no YouTube, é possível que eles não tenham comprado a palavra ‘Haddad’ e o anúncio tenha aparecido mesmo assim. Mas, não dá para afirmar que não compraram, e só daria para ter certeza vendo a segmentação dentro da conta deles”, diz Isabel.

“Há ainda a escolha de ‘negativar’ o termo ‘Haddad’, para evitar a exibição do anúncio deles para essa busca. Ou seja, os anunciantes podem controlar isso se quiserem”, ela acrescenta.

Hélio Silveira, um dos advogados da campanha de Jilmar Tatto, diz que não há objetivo de tentar barrar o anúncio de Doria por aparecer na busca por “Haddad”. Mas o fato deve ser usado como um dos argumentos na apelação ao TSE no caso do senador do PT.

“Se o eleitor procurar Haddad e aparecer Doria, ele só tem que ver que é propaganda paga. A do Jilmar ele vê que é publicidade. Aquele espaço de buscador não pertence a nenhuma campanha. É justamente esse sistema de busca e vinculação que ajuda o eleitor a ver opções e escolher”, ele diz.

O que foi decidido até agora

“O eleitor, ao buscar o nome de Ricardo Tripoli no mecanismo de busca Google, intenciona obter informações acerca de candidatura ao Senado, e não de seus adversários”, diz o relator da ação no TRE, o juiz Mauricio Fiorito.

A decisão indica trecho da lei que diz que os anúncios na internet devem ser feitos “somente em benefício da candidatura contratante”. Eles devem ser, portanto, “vedados, por consequência, sua utilização em prejuízo das candidaturas adversárias.”

O colegiado do TRE concordou com a decisão de que a campanha de Jilmar fez uso de “estratagema” para “desviar em seu proveito” o espaço dos adversários.


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