Magistrado de SP considerou que a Crefisa agiu de má-fé.
Um idoso analfabeto, que recebe apenas um salário mínimo mensal, será indenizado pela Crefisa por cobranças de taxas de empréstimos que chegavam a 628% ao ano. A decisão é do juiz de Direito Carlos Eduardo D’Elia Salvatori, da 5ª vara Cível de Osasco (SP).
O autor da ação alega, em síntese, que celebrou dois contratos de empréstimo pessoal, os quais foram quitados. Entretanto, acusou que as taxas de juros remuneratórios cobradas foram abusivas (respectivamente, 18 e 17% ao mês), muito acima da taxa média do mercado, de sorte que a espoliação lhe causou danos morais.
Requereu, assim, a revisão da taxa de juros, reduzindo o percentual à média do mercado à época de cada contrato; a condenação da requerida ao pagamento de R$ 4.577,52, a título de restituição em dobro; e a condenação da Crefisa ao pagamento de R$ 52.250, a título de ressarcimento dos danos morais.
No mérito, a requerida aduziu que concede crédito a consumidores de alto risco, de modo que não haveria abuso na taxa de juros cobrada e salientou que, no presente caso, não se tratava de empréstimo consignado em folha, e sim em débito na conta corrente.
Juros abusivos
Sobre as taxas de juros cobradas, o juiz ponderou sobre a jurisprudência dos Tribunais Superiores no sentido de não haver nenhuma ilegalidade na pactuação de juros que excedam 12% ao ano, especialmente se condizente com a taxa média de mercado divulgada pelo Banco Central, desde que não sejam manifestamente abusivos, o que deve ser verificado em cada caso concreto.
A respeito do caso em questão, o magistrado afirmou que ainda que a atividade da requerida envolva extremo risco por conceder crédito a pessoas que tem o nome maculado por órgãos de proteção ao crédito, nada justifica a cobrança de taxa de juros remuneratórios nesse patamar, suplantando, em muito, a taxa média do mercado para a mesma modalidade de contrato e na mesma época.
“As cláusulas que previram as taxas de juros anuais de 628,76 e 558,01% são abusivas, vale dizer, houve abuso da autonomia privada nesse mister, nos termos do art. 51, inciso IV, do CDC, o que leva à nulidade parcial, com base nos arts. 104, inciso II, e 184, do Código Civil.”
O juiz defendeu ainda que houve má-fé por parte da Crefisa, “que certamente sabe das implicações da incidência dessa taxa, agindo contrariamente aos ditames de eticidade”.
Danos morais
O julgador do caso ressaltou que o dano moral suportado pelo autor é in re ipsa, vez que o tolhimento de excessiva parte de seus provimentos de aposentadoria, através da sistemática do débito automático próximo ao recebimento. “Decerto, o orçamento doméstico já deficitário é impactado ainda mais no médio longo prazo, gerando agruras psicológicas efetivas”.
Entretanto, minorou o valor por considerar que “ainda que seja analfabeto como descrito na petição inicial, não é incapaz, devendo empreender o mínimo cuidado ao aceitar esse tipo de crédito”.
Sendo assim, julgou os pedidos parcialmente procedentes e determinou que seja declarada nula a extensão das taxas de juros que se mostraram abusivas nos contratos, adequando as cláusulas às taxas médias do mercado, respectivamente 126% e 125% ao ano; condenou a requerida à restituição da parte excedente em dobro, já descontado as taxas de IOF, nos montantes de R$ 2.499,34 e R$ 2.001,42; e condenou a requerida ao pagamento de R$ 5 mil, a título de ressarcimento dos danos morais.
Os advogados Willian Oliveira Peniche e Vitor Matera Moya atuaram pelo idoso.
- Processo: 1003287-05.2020.8.26.0405
Veja a decisão.