Sífilis, HIV/Aids e hepatites estão entre as doenças ‘silenciosas’ com índices crescentes no país; ‘por não sentirem nada, as pessoas não procuram o médico e não descobrem que estão infectadas’.
Por BBC
Todos os dias, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), são contabilizados no mundo mais de 1 milhão de casos de infecções sexualmente transmissíveis (ISTs) curáveis entre pessoas de 15 a 49 anos. E essas doenças estão em alta no Brasil, segundo dados coletados pelo Ministério da Saúde.
A sífilis é o caso mais gritante: foram 158 mil notificações da doença em 2018, levando a uma taxa de 75,8 casos para cada 100 mil habitantes — em 2017, eram 59,1 casos/100 mil habitantes.
Mas há indicativos também de que estejam aumentando as hepatites virais, enfermidades altamente perigosas, pois podem evoluir para cirrose e câncer de fígado e até levar à morte. Se de 2008 até 2018 o Brasil registrou quase 633 mil casos dessas infecções, só no ano passado foram cerca de 43 mil, somadas as hepatites A, B C e D.
Dados do Unaids, programa das Nações Unidas especializado na epidemia, indicam que o Brasil apresentou aumento de 21% no número de novos casos de infecções por HIV de 2010 a 2018, o que vai na contramão mundial, já que, no mesmo período, a queda foi de 16% no planeta.
E não são apenas essas ISTs que estão em alta. As que que não são de notificação obrigatória, como gonorreia e HPV, também estão crescendo no país.
Para Mauro Romero Leal Passos, coordenador do setor de DST da Universidade Federal Fluminense (UFF) e fundador da Sociedade Brasileira de Doenças Sexualmente Transmissíveis (SBDST), a principal razão é que muitas dessas doenças são silenciosas, podendo ficar meses ou anos sem apresentarem sinais e sintomas.
“Por não sentirem nada, as pessoas não procuram o médico e não descobrem que estão infectadas. Sem saberem, a chance de transmissão do vírus ou da bactéria para os parceiros, com sexo sem proteção, é muito maior”, comenta o médico.
Outro ponto importante, segundo ele, é a diminuição no uso dos preservativos, sobretudo entre os jovens.
Para se ter uma ideia, pesquisa realizada em 2017, com 1,5 mil pessoas em todo o Brasil, pela organização sem fins lucrativos DKT International, identificou que 47% dos entrevistados com idade entre 14 e 24 anos não usam camisinha nas relações sexuais.
Essa negligência acontece porque os tratamentos contra as doenças sexualmente transmissíveis estão mais eficazes e porque muita gente não acredita estar em perigo e nem se considera parte de grupos de risco.
Ainda persistem as desculpas de que camisinha reduz o prazer, prejudica a ereção e é difícil de colocar.
“E não adianta usar o preservativo uma vez ou até se sentir seguro com o parceiro. É preciso se proteger em todas as relações”, acrescenta Passos.
Outros fatores apontados por especialistas para a alta incidência de ISTs são os baixos índices de educação sexual e de cobertura vacinal (no caso de doenças que podem ser prevenidas por vacinas).
O que são infecções sexualmente transmissíveis (ISTs)?
As ISTs são causadas por mais de 30 vírus e bactérias e transmitidas, principalmente, por relação sexual vaginal, anal e oral desprotegida, ou seja, sem o uso de preservativo, com uma pessoa infectada.
Também podem ser passadas da mãe para a criança durante a gestação, no parto ou na amamentação. Algumas são transmitidas pelo contato de mucosas e pele com secreções corporais contaminadas, sangue infectado e uso de drogas injetáveis.
No geral, essas doenças causam lesões nos órgãos genitais. Mas também podem provocar câncer, complicações na gravidez e no parto, aborto, infertilidade, problemas neurológicos e cardiovasculares e até a morte.
“Há ainda as sequelas emocionais e sociais, que muita gente esquece. Não é incomum o portador desenvolver distúrbios psiquiátricos e ter problemas no relacionamento”, analisa Passos.
Outro fator bem preocupante é que essas patologias deixam os pacientes mais vulneráveis a adquirir o HIV. A estimativa é que elevam em até 18 vezes a chance de infecção pelo vírus da Aids.
Isso porque quem já tem alguma IST tem mais risco de contrair outra. “Se a pessoa tem uma inflamação, ferida, tumor, verruga, laceração ou secreção, sua resistência geral ou local está diminuída, então, quando ela entra em contato com outro agente, a entrada é facilitada”, complementa o coordenador do setor de DST da UFF.
A seguir, saiba mais sobre as ISTs que estão em alta no Brasil, de sintomas à prevenção:
Clamídia e gonorreia
Causadas por bactérias, essas doenças estão associadas, e ambas podem atingir os órgãos genitais, a garganta e os olhos.
As duas doenças são quase sempre assintomáticas. Porém, quando apresentam sintomas, os mais frequentes, nas mulheres, são corrimento vaginal com dor no baixo ventre e dor ou sangramento durante a relação sexual. Nos homens, é corrimento no pênis, com ou sem pus, ardor e esquentamento ao urinar e dor nos testículos.
Se não tratadas corretamente, podem evoluir para Doença Inflamatória Pélvica (DIP) e ainda causar infertilidade, dor crônica, gravidez tubária (nas trompas), aborto, endometrite e parto precoce.
Tanto a clamídia quanto a gonorreia são curadas com o uso de antibióticos – os parceiros também devem tomar o medicamento, mesmo que não apresentem sinais.
Durante o período de infecção, é aconselhável evitar contato sexual desprotegido, e a melhor forma de prevenção é justamente o uso de camisinha.