Austelino Mattos, de Mogi das Cruzes, ficou quase uma semana em UTI de hospital de Suzano. Ele se recupera em casa e pede para população seguir orientações: “Senti na pele e sei o que é”.
Diante do número crescente de casos de pessoas com coronavírus no Brasil e no mundo, existem também os exemplos de pacientes que superaram ou ainda superam a doença e que, agora, compartilham a experiência, até como forma de conscientizar a população.
E um desses exemplos é o do médico Austelino Ferreira Mattos, de Mogi das Cruzes (SP). O angiologista, cirurgião vascular e emergencista do Hospital Santa Maria de Suzano, de 56 anos, teve confirmado o diagnóstico da Covid-19 e chegou a ficar internado na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) por quase uma semana, mas já está em casa, onde procura se recuperar depois de um grande susto.
Cinco dias após ter recebido alta do hospital, Austelino relatou como foi o período em que teve de enfrentar os fortes sintomas provocados pelo coronavírus. Ele conta que tudo começou no dia 15 de março, quando teve quadro de febre, dor no corpo e dificuldades para respirar. No dia seguinte, o médico procurou o hospital para fazer exames e uma tomografia já indicou um processo inflamatório no pulmão, com característica do coronavírus. Porém, como os sintomas ainda eram leves, Austelino decidiu fazer quarentena em casa, tomando analgésico e mantendo repouso.
“Depois de uns três dias, minha falta de ar intensificou. Começou a ficar muito grande, e eu já tinha dificuldade até para subir escada, então procurei o hospital de novo e repeti a tomografia. A imagem do pulmão tinha piorado muito, com processo inflamatório muito grande, e a minha saturação de oxigênio no sangue regulava por volta de 85, 86, quase precisando fazer entubação e ventilação mecânica. Aí decidi ficar internado na UTI do Hospital Santa Maria, em Suzano”.
“O sintoma que mais me incomodava mesmo era falta de ar. Eu me cansava muito. Aí você começa a perder o olfato, o paladar. Vai tomar água e a água está amarga. A dor no corpo é muito grande, e você se incomoda até de ficar deitado”.
Austelino conta que ficou internado na UTI de 19 a 25 de março. Nesse período, ele diz que a falta de ar era muito grande e que ele dependia muito do oxigênio. De acordo com o médico, também foi iniciado tratamento para evitar uma infecção pulmonar secundária. Ele conta que, gradativamente, a falta de ar foi melhorando, e houve também diminuição da febre e do cansaço, o que lhe permitia ficar sentado.
“Foi um período muito difícil, porque, além da falta de ar, eu tinha que ficar muito tempo deitado. Às vezes doía muito as costas, tinha dor de cabeça. Era uma sensação ruim. Não conseguia comer nada porque não tinha fome. A única coisa que conseguia tomar era suco, e água só se fosse com gás, porque a normal amargava na boca. Na quarta-feira (25) à tarde eles me liberaram para o quarto, e aí foi um pouco melhor, mas mesmo assim havia períodos em que eu dependia um pouco do oxigênio, senão minha saturação caía. Na sexta-feira eu já estava saturando melhor e me deram alta para eu manter a quarentena por pelo menos mais 10, 15 dias em casa”.
Neste momento, Austelino está em casa com a esposa, cujo exame para coronavírus também deu positivo, mas sem apresentar qualquer sintoma, segundo ele. O médico segue em recuperação da doença, embora diga se considerar praticamente curado, por não lidar mais com os principais sintomas da Covid-19.
“Aqui em casa estou mais assistindo televisão, lendo meus livros. É fazer passar o tempo. Ainda me sinto um pouco cansado, mas é muito pouco. Se comparar com duas semanas atrás, está bem melhor. Não dá nem para reclamar. A única coisa que estou evitando, porque minha imunidade ainda está um pouco baixa, é circular na rua, para não ter problema de reinfecção. Quanto ao contágio, já passou a janela de 14 dias, então não tem mais risco de eu transmitir para alguém. A coisa está mais tranquila”.
Em relação à maneira como contraiu o coronavírus, Austelino considera duas hipóteses: uma viagem que fez a Maceió, onde havia muitos estrangeiros, e o atendimento a uma paciente no Pronto Socorro do próprio Hospital Santa Maria, em Suzano. O fato é que, depois de ter vivido a experiência da doença, o médico busca agora passar uma mensagem de conscientização, principalmente no sentido de que o coronavírus pode afetar pessoas das mais variadas idades.
“É uma doença muito perigosa. E não fique achando que só pega idoso. Pega pessoas novas também. Tanto que têm aparecido casos de pessoas abaixo de 60 anos, então peço à população que siga as instruções da Vigilância Sanitária e do Ministério da Saúde, para que se previna e evite aglomerações e contato com pessoas contaminadas. Não é coisa para se ficar brincando. Eu senti na pele e sei o que é uma insuficiência respiratória grave. Agradeço a Deus por estar vivo hoje e por não ter sido entubado, porque uma entubação e uma ventilação mecânica trazem complicações, a pneumonia, que é o que leva a maioria dos pacientes à morte”.
Austelino planeja voltar ao trabalho em 10 dias, mas, a princípio, deve atender apenas em consultório. Segundo ele, a volta para o atendimento no Pronto Socorro deve levar de 30 a 60 dias, pelo fato de a imunidade ainda estar baixa, evitando, assim, uma recaída.
Por fim, Austelino acredita que ter enfrentado o coronavírus foi uma experiência que lhe deixou alguns ensinamentos pessoais e que ele se vê ainda mais forte a partir de agora. Como médico, ele também crê que a pandemia da Covid-19 pode render mudanças importantes na segurança de trabalho dos profissionais da saúde.
“Saio muito fortalecido, com uma visão diferente de vida, em que preciso viver mais e trabalhar menos. As coisas estão passando muito rápido, e eu estou vendo a vida passar e esquecendo de mim mesmo. Preciso trabalhar com mais qualidade de vida. As emergências do país nunca se preocuparam com biossegurança. Os profissionais de saúde estão desprotegidos e colocados em segundo plano. Acho que, a partir da Covid-19, haverá grandes mudanças quanto ao uso de proteção e no atendimento nas emergências do país, evitando a contaminação dos profissionais de saúde”.