Cláudio Sérgio Martins Júnior teve 80% do pulmão comprometidos e retirou 45 cm do intestino por complicações da doença.
“Quando eu saí [do coma] e me dei conta do que tinha acontecido, pensei: ‘não acredito que estou vivo'”. O relato é do médico Cláudio Sérgio Martins Júnior, de 32 anos, que teve 80% do pulmão comprometidos e retirou 45 cm do intestino por complicações causadas pela Covid-19. Foram 59 dias de internação, 30 em coma induzido na Unidade de Terapia Intensiva (UTI). A informação é de Leticia Gomes, G1 Santos.
Morador de São Vicente, no litoral paulista, ele retornou esta semana à linha de frente do combate à doença. “Atender é voltar um pedacinho da vida que a doença tentou me roubar”, descreve Cláudio.
Formado há quatro anos, o médico estudou no Paraná e voltou para a Baixada Santista para trabalhar na cidade natal. No início da pandemia, ele atuava em uma Unidade Básica de Saúde (UBS) e no Hospital Municipal de São Vicente. Depois de meses atuando na linha de frente, ele teve uma febre fraca. Ao longo dos dias, começou a sentir um cansaço forte e, pouco tempo depois, a saturação começou a baixar.
Acompanhando a situação e evolução da doença em casa, o médico precisou ir ao hospital quando o cansaço ficou muito forte. Mesmo com medicações, 25% do pulmão já estava comprometido. Ele voltou para casa, mas, depois da persistência dos sintomas, precisou retornar ao Hospital Santa Casa, onde ficou internado.
A internação ocorreu em agosto, e o médico teve alta apenas em outubro. Em 59 dias, além de o pulmão chegar a 80% de comprometimento, o intestino sofreu com complicações da doença, uma isquemia mesentérica, condição médica que fez com que ele tivesse retirados 45 centímetros do intestino delgado.
Cláudio Sérgio precisou passar por uma uma traqueostomia, ficando 36 dias entubado, em coma induzido. A situação causou surpresa ao médico, por ele ser jovem e não ter nenhuma doença pré-existente. Mesmo na linha de frente, não esperava que a doença causasse algo tão sério.
“Não imaginava que pudesse ter sido tão grave, até porque eu não tinha acompanhado, próximo a mim, nenhum caso de paciente jovem que chegou a um estado tão crítico”, relembra o médico. Ele explica que, nesse período, ficou se questionando sobre o porquê algo assim teria acontecido e o acometido, mesmo sendo novo.
Cláudio revela que mudou o comportamento ao perceber que teve uma segunda chance, que outros pacientes não tiveram. “Decidi honrar meus amigos, meus pais, os médicos e enfermeiras que lutaram por mim e minha vida”, conta emocionado. Ele diz que, ao ter alta, é como se tivesse voltado a ser criança – precisou passar por um processo para voltar a andar, falar, se alimentar sozinho e recuperar a autonomia.
A recuperação, prevista para seis meses, aconteceu em 50 dias, e o médico voltou a atender na UBS do município. Apesar do retorno, ele ainda precisa de fisioterapia e tratamento em casa. Mas, a volta ao trabalho, define, é algo gratificante.
“Não dá para voltar a mesma pessoa. A gente passa a olhar o paciente com olhos mais humanos. Estar no lugar deles é difícil. Eu não queria ter vivido isso, mas eu não posso fazer isso ser em vão. Já que eu vivi, vou aprender alguma coisa com todo esse momento de dificuldade”, define o médico.
Cláudio, hoje, mora com os pais, até passar pelo processo de recuperação e voltar a ter total independência. Passar por isso tem sido difícil, mas fez com que ele refletisse e tentasse conscientizar amigos e familiares. “Eu renasci, não era minha hora, mesmo. O vírus pode entrar em você, dar uma voltinha e ir embora, ou pode entrar e causar um estrago. Por isso, é preciso se conscientizar, a gente já aguentou tanto [a quarentena], podemos aguentar um pouco mais”, finaliza.