Os dois suspeitos do crime respondem em liberdade. Segundo o Ministério Público de MS, não há dúvida de que houve intenção de matar. Defesa alega que foi “uma brincadeira”.
Por Jaqueline Naujorks, G1MS — Campo Grande
No dia 14 de fevereiro de 2017, morreu em Campo Grande o jovem Wesner Oliveira, de 17 anos, após perder parte do intestino ao ter uma mangueira de ar-comprimido de lava-jato introduzida no ânus.
Os suspeitos pelo crime, o dono do lava-jato e um funcionário, respondem em liberdade. Antes de morrer, o garoto negou que a agressão tenha sido uma brincadeira.
De acordo com o Ministério Público de MS, há um impasse em torno da questão se houve ou não intenção de matar: “Entre a Justiça entender se o crime foi culposo ou doloso, há uma família enlutada esperando por esse desfecho”, declarou o promotor José Arturo Bobadilla nesta segunda-feira (18).
A agressão aconteceu em 3 de fevereiro de 2017. Wesner ficou 11 dias internado, e chegou a gravar um vídeo agradecendo as orações. Além do ferimento no intestino, o rapaz tinha uma lesão no esôfago e sofreu hemorragia, morrendo em decorrência de uma parada cardíaca.
O pedido de prisão dos suspeitos foi feito pelo delegado Paulo Sérgio Lauretto, à época na Delegacia Especializada de Proteção à Criança e ao Adolescente (Depca) no dia da morte do rapaz, quando saiu o laudo confirmando a lesão corporal grave. Três dias depois, a Justiça negou o pedido de prisão dos suspeitos.
O dono do lava-jato, Thiago Demarco Sena, de 26 anos, e o funcionário Willian Henrique Larrea, de 30, suspeitos de violentar Wesner, nunca foram presos. De acordo com o advogado Francisco Guedes Neto, a defesa segue com o argumento de que foi “uma brincadeira”:
“Não se pode buscar uma condenação em uma ação penal injusta para reparar eventual dano ocorrido à família, ou seja, para reparar o luto”, afirmou nesta segunda-feira (18).
O promotor Bobadilla explica que o processo está sem andamento desde agosto de 2018. Na penúltima decisão, o juiz entendeu que a dupla não teve intenção de matar e desclassificou o crime de homicídio doloso: “Que os réus respondam por outro crime não doloso à vida”, diz a decisão.
No dia 14 de agosto do ano passado, a Justiça determinou o pagamento de pensão no valor de R$636 por parte dos réus para a família de Wesner por 47 anos, porém a defesa entrou com recurso. Em 23 de agosto, a 15° Procuradoria de Justiça Criminal deu parecer favorável ao recurso do Ministério Público que afirma tratar-se de crime doloso, com intenção de matar, mas ainda não foi julgado:
“Desde então esse processo está parado. Para o Ministério Público não há dúvidas de que houve intenção no crime, eles seguraram o rapaz, não se pratica uma ação dessas sem a noção de que possa causar dano ou mesmo a morte da vítima”, afirma.
“Não ia querer essa brincadeira nunca”
A família de Wesner permanece aguardando que os suspeitos respondam pelo crime. A mãe do rapaz, Marisilva Moreira da Silva, relata que William era amigo de seu filho, e que quando Wesner conseguiu o emprego no lava-jato, recomendou que cuidasse do jovem. A mãe do rapaz não se conforma: “Por que fizeram isso com o meu menino?” questiona, emocionada.
Segundo a família de Wesner, quando estava no hospital o rapaz relatou à família o que tinha acontecido e disse que perdoava os agressores.
Às oitivas do caso, apontam que a vítima não consentiu e, inclusive, pedia para o patrão e o colega pararem, sem ser atendido. De acordo com os documentos, a vítima teria pedido para Willian, seu colega, comprar um refrigerante para que juntos consumissem, e este passou a “bater” com um pano usado para limpar carros no adolescente.
No relato do caso consta que Wesner pedia para William parar . Sem ser atendido, o adolescente correu, foi perseguido, agarrado e imobilizado por Willian. Na sequência, Thiago (o dono do lava-jato) foi ao encontro da dupla com a mangueira de ar, utilizada para limpeza de veículos no lava-jato, ligando o equipamento e introduzindo no ânus da vítima, que passou mal e vomitou.
O adolescente recebeu atendimento médico em dois hospitais. Foram feitas inúmeras diligências no decorrer do inquérito, com apreensões, fotografias, laudos, exames nas roupas que Wesner usava e outros objetos. Questionado pela polícia, ainda internado, Wesner reafirmou que não foi uma brincadeira e que os colegas sabiam o que estavam fazendo:
“Isso não é brincadeira! Não era brincadeira. Eu não ia querer essa brincadeira nunca….pegaram eu de supresa (…) E o Thiago agarrou minhas duas pernas, segurou. Eu gritei. Mandei parar, mas não pararam. O Thiago que ligou o compressor e colocou a mangueira em mim…”
Segundo o promotor, o Ministério Público agora aguarda o julgamento do parecer juntado ao processo que está no Tribunal de Justiça de MS há 6 meses: “São dois anos de impunidade, de sofrimento para esta família sem que os suspeitos sejam presos ou julgados, e tanto o Ministério Público quanto a sociedade esperam que o poder Judiciário faça o seu papel e se pronuncie, o que não podemos é ficar sem um desfecho para este caso”, finaliza.