Medida foi tomada para evitar transmissão do novo coronavírus nos veículos usados para viagens pagas por aplicativos
Especialista explica que medida diminui, mas não zera risco de contágio.
Motoristas de aplicativo encontraram uma solução curiosa para continuar trabalhando em meio à pandemia. Tentando evitar uma possível transmissão comunitária do novo coronavírus, eles construíram um isolamento para os passageiros viajarem no banco de trás sem ter contato com os motoristas na Baixada Santista, no litoral de São Paulo.
“É uma forma de se precaver tanto nossa, quanto do passageiro”, defende o motorista Gerson Alexandre, de 35 anos. Ele é de Itanhaém, mas faz viagens em Santos, São Vicente e Praia Grande. “Faço higienização a cada duas horas com uma mistura de álcool, água e depois um pouco de cloro. Deixo secar e recomeço as corridas”, conta.
A barreira de plástico criada por Gerson (veja vídeo acima) permite que os passageiros entrem e saiam do veículo sem ter contato com o motorista. E ele garante: passageiros, só no banco de trás. “Não pego viagem com mais de três pessoas. Ninguém mais senta ao meu lado”, diz. O dinheiro é passado pelo porta-copos, e ele higieniza as mãos com álcool em gel depois de guardá-lo.
O ar-condicionado fica desligado e todas as janelas do veículo ficam abertas, de acordo com o motorista. Assim, o ar circula e não fica concentrado dentro do carro.
“Não precisa ter conhecimento para montar [a barreira]. Soltei as laterais dos cintos de segurança, prendi por dentro e usei pregos bem finos, que não estragam o carro”, conta. De acordo com Gerson, passageiros e outros motoristas gostaram da ideia. “Estão perguntando como fiz, o que comprei e dicas para montar. Acho que a moda pega.”
Outro motorista que aderiu ao isolamento dentro do próprio carro foi André Lucas, de 38 anos, de Peruíbe, que faz viagens em Praia Grande. A ideia veio a partir de um meme. “Vi um meme de um cara isolado com insulfilme para fazer graça e pensei: dá pra fazer direitinho”, conta.
“Infelizmente, creio que dias piores virão. Sei que vou precisar sair para trabalhar e estou me prevenindo. Não sei se amanhã vou ter condições de comprar ou mesmo se vou encontrar esses materiais que usei para fazer a bolha”, relata.
André é filho de tapeceiro e, para ele, isso ajudou na hora de construir o isolamento, que ele apelidou de ‘bolha’. “Trabalhei com o meu pai por muito tempo. Consegui fazer de uma forma que dá pra tirar e colocar, usando velcro”, explica.
O motorista diz que gastou R$ 60 em todo o material usado e, além disso, desinfecta a parte de trás do veículo a cada viagem. “Como estamos com poucos passageiros, toda corrida que acaba, eu coloco máscara e borrifo álcool e desinfecto a parte de trás.”
Os passageiros parecem ter aprovado a ‘bolha’ do carro de André. “Eles gostaram, acham legal. Antes de entrar pergunto se não incomoda. Até agora, apenas um se sentiu incomodado e não quis ficar no carro”, relata.
“Perguntei se ele queria cancelar e ele disse que sim. Acabei dando a volta no quarteirão e deixando ele no mesmo lugar. Ninguém é obrigado a nada, mas ainda tem gente que não acredita no coronavírus”, diz André.
Em contato com a assessoria da empresa Uber, por onde os motoristas trabalham e, por telefone, a empresa informou que não há problemas com o uso do isolamento dentro dos veículos, contanto que não infrinja as leis de trânsito.
O infectologista Dr. Michel Soane explica que a medida adotada pelos motoristas reduz o risco de contágio deles, mas não zera. “O passageiro que ficaria falando atrás, jogando perdigotos para frente, fica isolado. Dificulta para chegar no motorista, mas ainda há risco”, observa.
Mesmo assim, é preciso ter atenção no momento de fazer a limpeza. “Ele precisa tomar cuidado na hora de limpar a parte de trás e garantir que essa limpeza será eficiente”. O especialista recomenda o uso de borrifadores com álcool 70% com pano ou papel descartável, além do uso de luvas e prestar atenção para não se apoiar com as mãos nos bancos traseiros antes da limpeza. Durante as viagens, deixar os vidros abertos.
Para os passageiros, no entanto, o risco de contágio seria o mesmo que ao usar transporte público. “Precisa limpar entre cada viagem, senão um passageiro pode ser contaminado pelo outro, ao entrar no carro.”