A empresa começou a perfurar uma área crítica da barragem cinco dias antes da ruptura, concluiu perícia da Polícia Federal.
A realização de perfurações verticais foi o gatilho para a liquefação que provocou o rompimento da barragem da Vale em Brumadinho, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, em 2019. A conclusão sobre a causa da tragédia, que deixou 270 pessoas mortas, foi informada nesta sexta-feira (26) pela Polícia Federal (PF).
De acordo com a PF, a Vale contratou, em outubro de 2018, uma empresa para identificar as condições de resistência de diferentes seções da barragem. A parte mais baixa da estrutura era composta por um material mais fino, de baixa capacidade de suporte e, portanto, mais frágil.
A empresa contratada entregou à mineradora um diagnóstico em dezembro do mesmo ano, mas, antes de processar e analisar os resultados, a Vale deu início a perfurações verticais na barragem.
A mineradora tinha dois objetivos: complementar a investigação geotécnica iniciada pela contratada para identificar os materiais de cada ponto da estrutura e instalar novos instrumentos de monitoramento. “Esse trabalho começou ainda em dezembro, antes de as informações da primeira campanha serem processadas, e esse foi o erro. É como se a pessoa fosse fazer um exame de imagem e não entregasse o resultado ao médico para análise”, diz o delegado responsável pelas investigações, Luiz Augusto Pessoa Nogueira.
A empresa começou a perfurar uma área crítica da barragem cinco dias antes da ruptura. No 25 de janeiro, quando o rompimento ocorreu, o trabalho atingiu o ponto mais frágil, o que gerou uma onda de liquefação. “A perfuração induziu uma pressão de água de forma pontual em um ponto da barragem que era muito sensível, o que dobrou a pressão naquele ponto. Esse ponto sensível se rompeu por liquefação, que se propagou por toda a barragem”, explica o perito criminal federal Leonardo Mesquita de Souza, responsável pelo laudo.
Segundo ele, os piezômetros, instrumentos de monitoramento instalados na barragem, não identificaram o processo de liquefação, que ocorreu de forma rápida. Foram 30 segundos até o rompimento da estrutura. “Os piezômetros estavam sendo lidos de cinco em cinco minutos, e a última leitura, feita três minutos antes da ruptura, não mostrou nenhuma anomalia. Ou seja, a liquefação se processa de maneira tão rápida, é uma onda de ruptura tão rápida, que se formou 30 segundos antes da ruptura. Os instrumentos não conseguiram captar”, explica o perito criminal federal Leonardo Mesquita de Souza, responsável pelo laudo.
De acordo com o perito, em uma barragem com condição de estabilidade aceitável, uma perfuração não seria suficiente para provocar o rompimento. “Só que a condição de estabilidade dessa estrutura era marginal, abaixo da aceitável pelas normas”, afirma.
Em setembro de 2019, a PF indiciou sete funcionários da Vale e seis da consultora TÜV SÜD por falsidade ideológica e uso de documentos falsos. As duas empresas também foram indiciadas.
Conforme a corporação, funcionários das duas empresas celebraram contratos utilizando informações falsas contidas nos documentos de Declaração de Condição de Estabilidade (DCE), que permitiram que a barragem seguisse funcionando mesmo com critérios de segurança abaixo dos recomendados. De acordo com a PF, a partir do laudo, novas diligências serão realizadas. As investigações continuam.
Procurada para comentar a conclusão da PF, a Vale disse que “tomou conhecimento nesta sexta-feira (26) da expedição do laudo da perícia técnica da Polícia Federal sobre as possíveis causas do rompimento da Barragem I, da Mina Córrego do Feijão, em Brumadinho (MG)”. “A empresa avaliará o inteiro teor do laudo e oportunamente se manifestará nos autos por intermédio de seu advogado David Rechulski.”