Sociedade Brasileira de Hepatologia alerta que antes de acreditar em qualquer tratamento “milagroso”, é importante consultar um especialista.
O uso indiscriminado de chás e ervas aumentam as chances de problemas hepáticos graves, segundo a Sociedade Brasileira de Hepatologia.
Em relação à insuficiência hepática aguda, 26% dos casos no país são provocados por DILI, conhecida como Drug Induced Liver Injury, que são decorrentes do uso excessivo de medicamentos ou suplementos. Já 34% dos pacientes desenvolvem problemas por HILI, ou Herbal Induced Liver Injury, que são decorrentes do consumo de ervas de forma exacerbada ou sem prescrição médica.
O hepatologista Raimundo Paraná, membro da Sociedade Brasileira de Hepatologia, tem feito pesquisas sobre hepatotoxicidade. Ele ressalta que, desde o início da humanidade, os chás e ervas sempre foram muitos usados. Ele relembra que na década de 70 já se falava sobre toxicidade por causa de chás e esse uso vem aumentando ao longo dos anos.
Segundo ele, muitos prometem efeitos como emagrecimento rápido ou a solução de alguma doença, mas, na verdade, acabam provocando doenças hepáticas graves.
“Hoje já se estuda mais o tema, mas muitas pessoas usam esses chás indiscriminadamente. Na década de 70, na Bahia, houve um surto de uma doença hepática grave chamada de doença veno-oclusiva do fígado pelo chá da erva Maria Preta. Depois tivemos em outros estados outro surto associado ao chá de Confrei. Depois tivemos na Amazônia pela Sacaca”, explicou.
O médico ressalta que a divulgação de informações inverídicas divulgadas em redes sociais tem contribuído para o aumento dos casos e o retorno do uso de algumas substâncias.
“No Brasil sempre existiram doenças relacionadas ao uso de ervas e medicamentos, mas elas aumentaram exponencialmente nos últimos tempos. Inicialmente devido à internet, que acabou veiculando muita propaganda enganosa sobre uso de medicamentos e chás, fitoterápicos e fórmulas como milagrosos”, explicou o médico.
Uma das substâncias que ele chama atenção para os perigos está presente no chá-verde.
“O chá-verde, por exemplo, tem uma substância chamada catequina. Se ela for concentrada, ela causa um dano. Ela causa a morte das células do fígado. Quando você toma um chá-verde com água pode não ter problemas, agora se for em cápsula pode ter muito mais conteúdo, mil vezes mais catequina, a depender de como ela foi manipulada e como ela foi colocada naquela cápsula.”
A estudante Isabella Morais, de 34 anos, decidiu fazer uso de chás para emagrecer. Ela usou receitas que viu na internet por um período de três meses e perdeu quase os 7 kg que engordou nos últimos dois anos. Ela começou a ter diversos efeitos colaterais e decidiu suspender o uso.
“Eu tomava alguns desses chás de 2 a 3 vezes na semana. Algumas vezes senti cólicas e até mesmo diarreia. Depois que fui descobrindo o quanto era prejudicial parei”, contou ela.
Os sintomas apresentados por ela, segundo o especialista, são muito comuns e podem sinalizar que já há algum problema de saúde associado ao uso.
“Alguns pacientes podem ter um pouco de náusea. Geralmente ele mesmo para de usar. Outros vão ao médico, os exames mostram as enzimas do fígado elevadas e o paciente é orientado a parar de usar. Em 10% dos casos o paciente e mais sintomático. O paciente fica com os olhos mais amarelos, urina escura. A gente chama de uma hepatite ou uma colestase. Uma porcentagem pequena de pacientes tem uma forma chamada hepatite fulminante onde existe uma destruição aguda das células do fígado. Não tem condições de regeneração em 70% desses casos. Nesse caso, o paciente ou morre ou vai para um transplante de fígado.”
A hepatologista Melina Torres observou uma tendência de pacientes que não buscaram o atendimento adequado, principalmente nos últimos dois anos, e quando voltaram já estavam com um quadro avançado. Alguns fizeram uso de chás e anabolizantes no período.
“Estive com pessoas que já tinham doenças e deixaram de acompanhar, o que gerou um aumento de diagnóstico de câncer de fígado em estágio avançado e aumento de pacientes com a doença hepática descompensada”, explicou a médica.
De acordo com dados da Sociedade Brasileira de Hepatologia, 73% das pessoas com diagnóstico de câncer de fígado no Brasil já estão em estágio avançado da doença. A falta de exames de rotina imprescindíveis para o diagnóstico colabora com essa alta taxa.
A recomendação dos especialistas é fazer os exames de imagem pelo menos a cada seis meses. Sobre o uso de chás e outras substâncias, o médico orienta que é sempre ideal procurar um especialista e fugir das promessas que estão na Internet.
“Vendem promessas de tratamento que não têm nenhum respaldo científico e que absolutamente não fazem o que prometem ou, se fazem, tem um custo muito alto para a saúde do paciente. E esse custo geralmente é omitido no momento da prescrição”, alertou Raimundo Paraná.